Entrevista ao jornal O Estado de São Paulo,– 25 de janeiro de 2014

Qual será o maior problema da cidade daqui a 40 anos?

R. – Difícil prever. Depende da qualidade média das sucessivas administrações da cidade e do Estado, e do que acontecerá com o desenvolvimento do Brasil como um todo. As escolhas políticas que a população fará ao longo das décadas serão determinantes. Mas é inevitável arriscar alguns prognósticos.

– O crescimento da população será baixo: em torno de 30 por cento em 40 anos.

– Os problemas de saneamento e enchentes serão coisas do passado.

– O transporte será muitíssimo melhor do que hoje, graças à expansão do sistema metrô-CPTM. Nunca se investiu tanto nessa área quanto nos últimos dez anos, e até 2020 a rede de trilhos crescerá 150 por cento. Mas a mobilidade urbana nunca será uma maravilha. Basta você olhar as grandes metrópoles dos países desenvolvidos, com renda por habitante equivalente a três ou quatro vezes a nossa.

– A mobilidade urbana será também beneficiada pelas práticas de uso e ocupação múltiplas do solo, abandonando-se cada vez mais o urbanismo segregado, que orientou a construção de Brasília, por exemplo. O próprio comportamento das famílias e das empresas, no sentido de avaliarem melhor os custos das distâncias entre moradia e trabalho, vai reforçar essa tendência.

– O atendimento à saúde, se comparado com o atual, será bastante mais eficiente e abrangente, mas, como acontece no mundo inteiro, haverá insatisfação, pois a demanda por serviços de saúde crescerá num ritmo superior ao da renda. O ambiente cultural poderá ser excepcional, se tivermos a sorte de contar com governantes minimamente qualificados. O meio ambiente é a questão mais preocupante, pois tende a ser vítima preferencial da estratégia do “empurrar pra frente”.

Qual problema que estará mais próximo de ser superado?

R. Se “próximo” significar dez ou vinte anos, o saneamento, as enchentes e a difusão do transporte coletivo sobre trilhos.

Que conselhos/dicas você daria aos futuros prefeitos de SP?

R. Não lotearem a administração. Não ficarem atabalhoados quando caírem nas pesquisas nos primeiros meses da gestão, a fim de evitar cometer bobagens irrecuperáveis. Montar equipes nas quais, em suas áreas, os titulares saibam mais do que o prefeito. A ele cabe definir as prioridades de verdade, não apenas as midiáticas, cuidar dos recursos e controlar a execução.

Em sua opinião, qual o maior acerto de sua gestão?

R. De um lado, a melhora rápida na zeladoria da cidade, o recapeamento das ruas de todo o município em apenas um ano, a recuperação financeira da prefeitura, que estava quebrada, a redução de custos de obras e serviços. Do outro, as inovações em cada uma das áreas: Virada Cultural, AMAs, Nota Fiscal Paulistana, Programa Ler e Escrever (hoje copiado em todo o Brasil), Centro Cultural da Juventude Ruth Cardoso, o início do Expresso Tiradentes…

E o maior erro?

R. Francamente? A arquitetura da nova Praça Roosevelt, cuja reforma começou de fato na minha gestão. Tem chão de cimento demais. Outra coisa: não ter conseguido remover da Praça do Patriarca aquela estrutura enorme do Paulo Mendes da Rocha, que acabou com a praça. Um desrespeito ao José Bonifácio. A estrutura deveria ser levada para outro lugar, o Parque do Carmo, por exemplo.

Que tendência, tecnologia ou mudança social você prevê que vai mudar a vida nas cidades nas próximas décadas?

R. O desenvolvimento da Tecnologia da Informação vai permitir o controle online da qualidade dos serviços e de acidentes, orientar melhor o transporte, inibir a corrupção. Estamos ainda nos prolegômenos desse processo. Mas o impacto da TI irá mais longe, permitindo às pessoas e às empresas trabalharem e comprarem com menos deslocamentos pela cidade.

São Paulo ainda vai ser a maior e mais rica cidade do país?

R. A maior, certamente. A mais rica em termos de renda por habitante? Creio que já não é.  As cidades médias tendem a ganhar essa corrida. Mas a meta importante deve ser outra: a qualidade de vida.

Nos últimos anos o centro de SP tem sido mais valorizado, cultural e?comercialmente. Isso vai continuar? Vai mudar a cidade?

R. A tendência é continuar. Na área cultural pública ampliamos o mínimo básico durante a minha gestão no município e depois no Estado. Na região central, além da Virada Cultural, concebemos e iniciamos a Praça das Artes, fizemos o Museu do Futebol, o Catavento, o MAC no Ibirapuera, o Museu da Resistência, a São Paulo Escola de Teatro, a São Paulo Companhia de Ballet, reformamos a Biblioteca Mário de Andrade, retiramos a Prodam do Ibirapuera, abrindo espaço para mais exposições e estadualizamos o Museu Afro. Tudo isso se somou ao que já existia e se somará aos nossos projetos iniciais que já estão começando, como o Teatro da Dança, na Luz, e o Museu da Cidade, no Parque Dom Pedro. Do ponto de vista comercial, o papel solar da cidade e do seu centro tem tudo para se manter – do ponto de vista geográfico, econômico e de capacidade empresarial e de trabalho.

Hoje há uma discussão sobre o embate entre faixa de ônibus e o?espaço para carros. Essa discussão vai continuar? Ou vai ser qual em?10, 20, 30 e 40 anos?

R. É um falso embate. Faixas e corredores são relevantes? Claro que sim, sobretudo numa cidade que ainda precisa de muito transporte sobre trilhos. Qual é o problema, então? É o atabalhoamento, a falta absoluta de planejamento, o estilo de trabalho que lembra a estratégia de guerra da cavalaria antiga: “rápido e mal feito”.