O novo marco legal de ferrovias, já aprovado no Congresso Nacional, estimulará uma forte entrada de capital privado no setor ferroviário

José Serra
23/02/2023 | 03h00

Os investimentos no setor ferroviário pavimentam o caminho para um futuro melhor, ao conectar pessoas e empresas de forma eficiente, segura e sustentável. Os recentes planos nacionais ferroviários, que vêm sendo anunciados por diversos países, mostram que este setor é um dos componentes mais relevantes do sistema de transporte de uma sociedade. E o Brasil vem sinalizando que irá embarcar nessa tendência, tendo em vista medidas recentes que apontam para uma nova era de investimentos neste modal.

É importante ter claro que a construção de ferrovias, combinada com a ampliação da capacidade operacional dos vagões, produz enormes benefícios socioeconômicos: fomenta a agricultura e a mineração, reduz importantes gargalos logísticos, ativa o comércio, gera ganhos ambientais e viabiliza novos investimentos na indústria. Além disso, resulta em expansão do emprego e renda em diversos setores da sociedade.

De mais a mais, o desenvolvimento do setor ferroviário gera impactos positivos no meio ambiente. Isso porque os trens emitem menos gases de efeito estufa em comparação a outros modos de transporte, contribuindo para um ambiente mais limpo. Em 2019, dados do Fórum Econômico Mundial colocavam o Brasil na 85.ª posição entre 141 economias em termos de qualidade geral de infraestrutura de transporte. Aproximadamente 65% das cargas do País são transportadas por rodovias, com um porcentual menor movimentado via ferrovias, hidrovias, cabotagem, dutos e aviões. Para além da agenda de descarbonização, o setor ferroviário fornece também uma alternativa importante de mobilidade, reduzindo nossa dependência rodoviária e diminuindo o tráfego, sobretudo nas grandes cidades.

Também é importante ressaltar que a modernização do setor ferroviário de um país aumenta a velocidade e a confiabilidade das linhas férreas, criando oportunidades de negócios e trabalho. Com inovações tecnológicas, como trens de alta velocidade e sistemas inteligentes de gerenciamento de equipamentos, o tempo de viagem é diminuído consideravelmente. Ou seja, as cargas alcançam a demanda e as pessoas chegam a seus destinos com menores custo e tempo, resultando em maior produtividade na economia.

O setor público também se beneficia diretamente com o desenvolvimento local proporcionado pela expansão do transporte ferroviário. A lógica é simples. As ferrovias ativam o comércio e o empreendedorismo por onde passam, criando residências e novos negócios. A população se desenvolve e os governos absorvem ganhos fiscais a partir de corredores de desenvolvimento que se formam ao redor dos trilhos. Essa dinâmica é conhecida na literatura especializada como transbordamento fiscal, ou Spillover tax.

Diante de tantos benefícios, muitos países estão promovendo ações para atrair e ampliar os investimentos no setor ferroviário. A Índia, por exemplo, anunciou recentemente um orçamento com investimentos que superam os US$ 30 bilhões. Os recursos serão usados em parceria público-privada para aquisição de 55 mil vagões, 25 trens movidos a hidrogênio e 3 mil locomotivas elétricas, além de outros produtos e serviços. A Alemanha, por sua vez, anunciou um plano de restauração da sua malha ferroviária com € 86 bilhões para os próximos dez anos. Esses são exemplos de que o mundo vem apostando neste importante segmento do setor de transportes, no âmbito de uma agenda voltada para um desenvolvimento econômico cada vez mais sustentável.

Neste setor o Brasil tem enormes desafios para superar. De acordo com o atual Plano Nacional de Logística (PNL), as ferrovias nacionais hoje transportam cerca de 410 bilhões de toneladas por quilômetro, enquanto os demais setores transportam 1.930 bilhões. Isso quer dizer que apenas 17% de tudo o que é transportado no País passa pela nossa malha ferroviária. Precisamos promover um grande volume de investimentos neste modal nos próximos anos, seja para a construção de mais trilhos, seja para aumentar a capacidade operacional dos vagões. Conforme o PNL, o Poder Executivo federal prevê que o setor ferroviário poderá transportar o dobro da carga movimentada até 2035.

Diante deste quadro, o Ministério dos Transportes tem o desafio e a oportunidade de promover uma revolução no setor ferroviário desde já. Para tanto, conta com uma recém-criada (e inédita) Secretaria Nacional dedicada à formulação de políticas públicas do setor ferroviário.

O novo marco legal de ferrovias, projeto de lei de minha autoria, já aprovado pelo Congresso Nacional – mas que aguarda a deliberação dos vetos –, estimulará uma forte entrada de capital privado no setor ferroviário. A nova legislação desburocratiza o acesso ao mercado de ferrovias, criando incentivos para a interconexão da malha ferroviária nacional por meio das shortlines – linhas férreas mais curtas que se podem conectar com as estradas de ferro tidas como estruturantes.

Tudo indica que o País vai experimentar um período de expansão dos investimentos no setor ferroviário, tornando nossas linhas férreas mais eficientes, confiáveis e acessíveis. Com os novos avanços institucionais, o Brasil vai entrar nos trilhos.

*

ECONOMISTA

Deixe um comentário