Folha de S. Paulo, 1 de Dezembro de 1997

Têm voltado a circular ideias sobre modificações no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, visando reforçar seu papel como fonte de poupança para a economia e pecúlio para os assalariados. Apresentei uma proposta a esse respeito no início de 1996, quando ocupava o Ministério do Planejamento e Orçamento, prevendo a possibilidade de os assalariados optarem por um novo regime para os saques e as aplicações daquele fundo.

Em essência, seria permitido que o FGTS de cada assalariado passasse a ser creditado mensalmente em instituições financeiras especialmente credenciadas. A remuneração obtida poderia ser bem superior à atual (que é de 3% anual mais indexação), mas, como contrapartida, o assalariado não poderia retirar seu fundo até sua aposentadoria. Essa possibilidade aumentaria a poupança privada da economia, elevando também, em certa medida, a poupança total, ao menos durante uma geração. Isso supondo que uma parte do FGTS que deixasse de ser sacado em virtude do novo regime teria sido destinada ao consumo e que a mesma parcela, agora depositada numa instituição credenciada, financiaria investimentos e não consumo. O novo regime só valeria para os novos depósitos mensais do FGTS, pois se fosse aplicado ao estoque acumulado quebraria o sistema, diante da imobilização de 80% do estoque do FGTS em financiamentos a longo prazo e da recente tendência a saldos negativos entre arrecadação e saques correntes (déficit de R$ 335 milhões no segundo semestre de 1997).

A adesão ao novo regime seria voluntária – ou seja, quem desejasse poderia permanecer no atual sistema, pois muitos assalariados de menores rendimentos precisam dos saques do FGTS para viver, quando perdem o emprego. A eliminação compulsória desse direito acabaria exigindo, como contrapartida, a criação ou ampliação de outras indenizações, impondo encargos adicionais às empresas. A adesão voluntária não eliminaria o significado financeiro da inovação. Hoje, grosso modo, a arrecadação anual do FGTS é de cerca de R$ 13 bilhões.

Uma adesão inicial de apenas 5% (em valor) aumentaria a poupança privada em R$ 650 milhões anuais. E seu efeito de demonstração, sem dúvida, ampliaria a preferência pelo novo regime. Não há nenhum impedimento constitucional para a convivência de dois regimes de FGTS. Mas seria necessário cuidar para que a entrada em vigor do novo sistema não viesse provocar uma descapitalização do fundo, especialmente por parte daqueles que estão próximos da aposentadoria. Além disso, como evitar custos administrativos abusivos, a exemplo do Chile, com sua privatização da previdência?

Quando expus a proposta, captada e publicada de forma clara pelo repórter Ribamar Oliveira, do jornal “O Estado de S. Paulo” (25/2/96), alguns destacados dirigentes sindicais não reagiram bem no dia seguinte. Mas em que a ideia prejudicaria o trabalhador é algo que nunca souberam explicar.

De acordo com a condição paretiana da economia do bem-estar, chega-se a uma situação ótima quando a melhora de alguns não implica piora de ninguém. Este é o sonho óbvio de qualquer político conciliador, mas a solução nem sempre é óbvia. Por isso, transparência e o trabalho de persuasão serão fundamentais.